Ao Tomás
Querido Tomás,
Apesar de te escrever esta carta em Microsoft Office Word 2003 versão 6.0, escrevo-a como se em tempos não modernos (tempos melhores?), sem mordomias informáticas. Tentarei pôr o capricho natural que se emprega (empregava?) quando se manuscreve uma carta. Até porque não sei, nem quererei saber, escrever com “k’s” ou “lol’s” (lol!!). Será também forma de tornar estas palavras mais especiais, porque servem assim melhor o seu propósito.
Deparo-me muitas vezes a pensar, ou a sonhar, se serei diferente, melhor, em se terei porventura destino mais magnífico, superior. Se me estaria ou estará destinado algo especial...se farei a diferença, se me distinguirei... E se não, o porquê...Ponho-me a imaginar em como será o critério de escolha do toque divino, que abençoa os Ilustres com os seus inquestionáveis dons. Porque é que a um se dá a desassossegada inspiração para criar 5 esfuziantes poetas, e a um outro uma vida a crescer na miséria sem saber ler? Porque é que um será celebrado na História como “o rei do rock n’roll” e a voz desafinada de outro só será lembrada pelos seus próximos? Como se teve a sorte de nascer com o dom de criar uma “guernica”? como se nasceu com a infelicidade de nunca a poder ver...? O que torna uns glorificados, outros ignorados...? Como é que um lidera países, outro lava as ruas?; um desenha invenções, outro já foi inventado?; um manda, outro segue; um diz, outro ouve...
(... E pergunto-me que sorte me calhou – ou calhará - nesta lotaria de talento...)
Depois, faço o mesmo raciocínio para o lado oposto. Porque uns são privados de amor de uma mãe e outros não dão valor à que têm? Porque uns nunca terão possibilidade de uma boa formação e outros esbanjam cursos esplêndidos em vaidades materialistas? Porque são uns escolhidos para passarem vida de dificuldades e outros só dificultam a vida?
(...E reconheço-me afortunado e agradecido...)
E depois volto aos Ilustres e devaneio sobre a o carácter com que cada um é brindado, que te pode tornar um respeitoso homem de negócios ou um criminoso; ou sobre a força e coragem dada a uns bravos e a fraqueza infeliz com que se amolecem uns mais tristes, ou ainda sobre a graça e personalidade de cada um, que traz diferentes tonalidades à cor da sua vida – e quantos cinzentos não existem; e por ainda adiante...
...(E dou-me por contente com quem sou...)
O que torna uns especiais e outros não, não sei... Como o infortúnio escolhe uns, e outros não, não sei... Não tentarei entender a intenção de Deus, a vontade do destino, a escolha do karma, a sorte, o “é a vida”, como se quiser chamar... Sei é que em todas estas considerações metafísicas dou comigo a sentir-me mais pequeno, ou impotente, ou limitado e a, de forma automática, ir-te buscar mentalmente para te colocar num pedestal – simultaneamente pelo teu lado Especial e de Infortúnio – que se mistura, pois aquele revela-se verdadeiramente com este.
Dá-te a vida caminho mais difícil de trilhar, pista com mais obstáculos, mar mais conturbado, mas deu-te Deus (ou destino? Ou sorte? Ou...? ou?) a força para não te cansares nesse caminho, a coragem de esses obstáculos enfrentares, a valentia de te fazeres a esses “mares convulsos” de peito erguido – deu-te esse caractér exclusivo e ainda o embrulhou com uma personalidade que já de si é singular (mesmo que já te tenha dito que estás a ficar perigosamente igual a mim!!Mini-Me!!!! eheh)
Assim se ditou que crescesses, com maiores privações em vida de provas para dar – e só por isso já em Terra ganhaste o Céu. Mas o magnífico é conseguires elevar a tua condição heróica a um outro nível superior - por te teres habituado a ser herói desde pequenino, e por sempre teres respirado ares de valentia, não tens (nem deves nunca nunca ter) a postura de “coitadinho” e isso torna-te ainda melhor e deixa-nos ainda mais boquiabertos, orgulhosamente espantados. Não tens, nem precisas de ter, tratamento especial. Problemas têm infelizmente muitos, mas o que te torna Especial é uma inexplicável normalidade, que misturada com uma extraordinária solidez e firmeza na dor e sofrimento, tornam-te Tomás, grande rapaz, num verdadeiro exemplo. Azar atrás de azar, azar atrás de azar, azar atrás de azar... e continuas inabalável. O “Tomás sempre em pé”!
E por não teres tratamento especial e por estarmos acostumados à tua bravura incessante, não tens elogios pomposos por hábito. E nem carecem de ser feitos – sabes intuitamente o aplauso que te damos constantemente mesmo sem o dizermos, deverás saber todos os medos e receios que comungamos contigo mesmo sem o dizermos. Mas às vezes apetece aclamar e gritar alto, o mais alto possível, o espírito inabalável com que entras numa sala de operação e sais do recobro - não pedes, não lamentas, não exiges, não te consideras mal-aventurado, não baixas a cabeça, não te deixas ir abaixo e não deixas de ser tu próprio. É ao mesmo tempo de chorar e de sorrir. Quando te vemos a ter que atravessar mais um teste, o coraçao fica pequeno - com um “coitadinho do porquinho” - quando entras, e floresce grande - com um “coitadinho do porquinho” -quando sais e te vemos a passar com distinção.
E servem então estas palavras para essa aclamação, para essa formalização do teu estatuto. Porque preciso de as dizer. Porque quero celebrar com esta carta todo o teu valor e todos aqueles elogios que nunca foram ditos. És um herói! Não precisas que to digam, mas és um herói. Nasceste um Herói! Um Exemplo! Um Especial! Um Ilustre! O Nobel da Força Imperturbável! O Óscar da Coragem Estóica. Um suuuuuuper-porquinhooooooooooooooo (“prontos”, não aguentei a prosa clássica e formal...). E melhor, és o NOSSO Ilustre, o NOSSO super-porquinho!
Saíste mais uma vez de um hospital e de uma operação e disseste-nos “agora sim já tenho braço de ferro”. Foste mais uma vez tu próprio em toda a pujança desses teus valores nobres que tão poucos têm. Eu? Eu sinto-me mais pequeno e ao mesmo tempo maior. Pequeno por comparação, maior por projecção...Mais pequeno porque não fui prendado com tal caracter heróico, maior porque elevo-me em orgulho, rejubilo-me em contemplação e posso dizer “aquele é meu irmão”. Obrigado e Parabéns!
ORI ORI
16 Junho 2007